*Texto publicado originalmente na minha coluna da infomoney em 01/ago/2020
Há pouco mais de dois anos tive contato como uma startup de blockchain que dizia que iria revolucionar o mercado financeiro através de uma Exchange de cripto descentralizada, gerida pela comunidade e que teria uma usabilidade muito melhor do que qualquer outra. Naquele momento eu, sinceramente, não entendi muito bem o como aquilo seria feito, mas vi que se feito poderia ter um impacto imenso no mercado financeiro.
Foi esse meu primeiro contato com DEFI, descentralized finance, ou conjunto de plataformas, aplicações e protocolos que simulam estruturas do mercado financeiro tradicional em Blockchain e que, geralmente, tem ou pretendem ter, uma governança distribuída, onde a comunidade de usuários é quem gerencia a plataforma.
Essas estruturas têm entre elas estruturas para se conseguir fazer uma stablecoin de dólar como o DAI do Markerdao, protocolos de investimentos e empréstimos como o Aave e o Compound, exchanges descentralizadas como Uniswap e Balancer, emissores de derivativos como a Synthetix e por ai afora.
Todas têm em comum serem nativas do mundo cripto e portanto não transacionam moedas fiat. Apesar disso, os grandes volumes transacionados são de stablecoins de dólar como o Tether e o DAI, sendo esse o principal fator do grande aumento da representatividade das stablecoins no mundo cripto (hoje se transaciona muito mais stablecoins do que Bitcoins por exemplo). Além disso, praticamente todas as iniciativas são desenvolvidas na plataforma do Ethereum com vários tokens ERC-20 e estruturas facilitadas pelos smart contracts.
Vamos pegar o DAI como exemplo. Ele é uma stablecoin de dólar (1:1 com o dólar americano) e que tem sua cotação ajustada via um mecanismo de administração de colateral. Funciona assim. Você deposita na plataforma ETH (ou outras criptos aceitas) em valor equivalente a 150 dólares, e com base nisso pode retirar 100 DAIs que são emitidos.
À medida que esse colateral cai de preço, ou você deposita mais para manter o 50% de valor extra, ou o sistema o usa para “queimar” (destruir) os DAIs e te devolve o que sobrar. Entre tudo isso tem uma taxa de estabilidade que é paga por quem “pega” os DAI e que faz com que o preço do DAI fique sempre próximo do 1:1 com o dólar.
Por exemplo, se essa taxa está alta você tem incentivo a aumentar a quantidade de DAIs em circulação o que faria com que seu preço em relação ao dólar caísse e voltasse para o nível próximo de 1:1. Nesse link você tem uma explicação legal (em português) sobre todo esse mecanismo
Saindo um pouco do tequiniques, o que o MakerDAO nos permite é que depositemos um ativo digital (cripto) e peguemos outro em uma proporção definida. Em um futuro próximo, o que impede que esse ativo digital depositado seja o token de um imóvel?
E que com base nele emitíssemos DAI ou uma stablecoin atrelada a outra moeda, como o Real, por exemplo? Se isso for possível, e que me parece até provável, com a tokenização de ativos poderemos ter aqui um imenso potencial de empréstimos garantidos por colaterais sendo feitos de maneira rápida, prática, transparente e sem a gama de intermediários e custos que um empréstimo imobiliário hoje tem.
Nesse mundo pós-pandemia onde as poucas barreiras para o digital se extinguiram, consigo ver as DEX como uma forma de trabalhadores do mundo inteiro receberem remuneração pelos seus trabalhos e automaticamente converterem para as moedas que quiserem (criptos, ou moedas fiat representadas nesse mundo).
Como esses dois exemplos, são inúmeros os paralelos com o mercado financeiro tradicional que consigo fazer e o melhor de tudo é que certamente teremos casos de uso que no mercado tradicional não seriam possíveis mas que no mundo de smart contracts são, não só possíveis mas fáceis de implementar (já vi alguns para dizer a verdade).
Se você continua cético em relação a isso, ou acha que isso tudo é coisa do futuro longínquo, o fato do Compound alcançar esse semana a marca de USD 1,0 bilhão de ativos colocado em colateral e que, apesar de ainda termos somente pouco mais de 20.000 pessoas usando diariamente essas estruturas, o número de usuários diário vem dobrando mês após mês certamente é um ótimo prognóstico de que temos algo interessante aqui.
Os desafios de DEFI vem do fato de serem estruturas recentes, onde certamente teremos alguns tropeços, da parte relativa a como a regulamentação dos vários países se ajustará para englobá-las e, a que mais me preocupa, que é a escalabilidade da rede do Ethereum, que tem se mostrado o maior gargalo recentemente. Soluções que ampliem a capacidade da rede de lidar com essa enxurrada de demanda, sejam eles de interoperabilidade de redes, segunda camada ou alterações na rede mesmo serão essenciais para que DEFI continue sua trajetória.
Quanto mais vejo e entendo as estruturas, modelos de negócio e utilização que as DEFIs fazem dos protocolos de Blockchain, mais me fascino com elas. Te convido a entender e abrir a cabeça para isso que pode ser em breve a principal infraestrutura do mercado financeiro mundial. Podemos estar vendo um fenômeno similar ao fenômeno da Amazon, que nasceu como um site para vendas de livros online e hoje é a gigante que conhecemos.
Para entender mais:
Vídeo:
Entendendo do DAI (em português)
Investimentos no mundo crypto com Compound e Aave (em português)
Texto:
Introdução ao DEFI (em português) – Medium
DEFI Consensys report (em inglês)
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